Teto do rotativo previsto em lei deve prevalecer por falta de consenso do setor

Perto do fim do prazo para apresentação de proposta que reduza taxa, chance de acordo entre bancos, empresas de "maquininhas' e varejistas é remota; texto do programa estabelece limite de 100% do valor da dívida para cobrança de juros A menos de um mês do fim do prazo determinado pelo Congresso para que os bancos apresentem uma autorregulação que reduza a taxa do rotativo do cartão de crédito, a possibilidade de um consenso entre os setores envolvidos nas discussões – bancos, credenciadoras e varejo – está cada vez mais remota. Segundo apurou o Valor, já que não foi possível chegar a um acordo, a tendência é que a solução adotada seja a definida na lei do Desenrola, que estabelece o teto de 100% do valor da dívida para cobrança de juros. Nesse sentido, os bancos querem que autoridade monetária publique uma regulamentação antes do fim do prazo, em 1º de janeiro, para solucionar lacunas da lei, como a definição do principal da dívida e os prazos. Se o BC decidir não normatizar a nova lei, há temores de que cada instituição adote um padrão para operacionalizar o teto. As instituições financeiras também insistem em mudanças no parcelado sem juros. Segundo interlocutores, elas pedem que o BC "tome para si" a responsabilidade de adotar "medidas prudenciais" para limitar a modalidade, "para fazer com que os juros fiquem onde o risco está”. De acordo com participantes do setor ouvido pelo Valor, o BC avalia que não há tempo hábil para discutir mudanças mais estruturais neste momento. O processo, no entanto, não deve se encerrar neste ano, com o debate se estendendo para 2024. É nesse contexto que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se reunirá amanhã com representantes dos principais emissores de cartão de crédito do país. Participam do encontro Milton Maluhy, do Itaú Unibanco; Mario Leão, do Santander; Marcelo Noronha, do Bradesco; e Cristina Junqueira, do Nubank. Octavio de Lazari Junior, presidente do conselho diretor da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e ex-presidente do Bradesco, também participa. A lei do Desenrola, sancionada no início de outubro, deu 90 dias para que o mercado apresente e o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprove limites para as taxas de juros e encargos financeiros cobrados nos financiamentos (rotativo e parcelado) do cartão de crédito. Caso contrário, as taxas de juros da modalidade serão limitadas ao dobro do valor do principal da dívida no cartão. A expectativa de representantes de diferentes segmentos da cadeia de cartões é a de que o tema seja abordado na próxima reunião do CMN, que inclui a autoridade monetária, o Ministério da Fazenda e o Ministério do Planejamento. O encontro está previsto para 21 de dezembro e é o último do ano. Nada impede, contudo, que o colegiado faça um encontro extraordinário depois dessa data caso haja necessidade. Os bancos estimam que a mudança impacte em no máximo 2 pontos percentuais ao mês os juros do cartão rotativo. Dessa forma, o produto continuaria caro, mas a mudança poderia trazer prejuízos "significativos" às instituições e reduzir a oferta de crédito, segundo fonte que participa das discussões. Cursos Relacionados A avaliação é a de que, mesmo depois que o teto entre m vigor, o assunto deve continuar em pauta porque a nova regra não resolve totalmente o problema. O rotativo do cartão de crédito é a linha mais cara do sistema financeiro. Atualmente, os juros da modalidade estão em 14,94% ao mês ou 431,58% ao ano (embora só possam ser cobrados por um mês), segundo dados de outubro divulgados pelo BC. De acordo com a Febraban, o parcelado sem juros representa 15% do saldo de toda a carteira de crédito das famílias. O grupo de bancos formado por Itaú, Santander, Bradesco e Nubank já mandou ao BC uma proposta de autorregulamentação do teto estabelecido em lei, segundo apurou o Valor. Como o texto do Desenrola é bastante geral, a proposta busca endereçar algumas das dúvidas levantadas pelas instituições financeiras, explicitando, por exemplo, como se dará a operacionalização do teto e sugerindo prazos para implementação. Como o cartão de crédito envolve gastos recorrentes, bancos entendem que o cálculo do valor original da dívida não é estanque. Por exemplo, se no mês 1 o cliente atrasar a fatura e deixar R$ 500 entrarem no rotativo, a cobrança de juros fica limitada a outros R$ 500. Mas, se no mês 2 outros R$ 200 entrarem no rotativo, esse limite não é mais de R$ 500, mas de R$ 700. A ideia é que cada instituição estipule os juros cobrados, limitados ao atingimento do teto legal para a dívida. A operacionalização dessa sistemática, no entanto, não é simples. Por isso as instituições financeiras pedem um prazo para implementação. Como a lei fala em 90 dias, no entanto, não é consensual o entendimento de que a vigência poderá ser postergada. Outro ponto que gerou dúvidas foi se os juros de mora e a multa deveriam ser contabilizados no cálculo do limite e, nesse caso, o entendimento dos bancos é de que não

Teto do rotativo previsto em lei deve prevalecer por falta de consenso do setor

Perto do fim do prazo para apresentação de proposta que reduza taxa, chance de acordo entre bancos, empresas de "maquininhas' e varejistas é remota; texto do programa estabelece limite de 100% do valor da dívida para cobrança de juros A menos de um mês do fim do prazo determinado pelo Congresso para que os bancos apresentem uma autorregulação que reduza a taxa do rotativo do cartão de crédito, a possibilidade de um consenso entre os setores envolvidos nas discussões – bancos, credenciadoras e varejo – está cada vez mais remota. Segundo apurou o Valor, já que não foi possível chegar a um acordo, a tendência é que a solução adotada seja a definida na lei do Desenrola, que estabelece o teto de 100% do valor da dívida para cobrança de juros. Nesse sentido, os bancos querem que autoridade monetária publique uma regulamentação antes do fim do prazo, em 1º de janeiro, para solucionar lacunas da lei, como a definição do principal da dívida e os prazos. Se o BC decidir não normatizar a nova lei, há temores de que cada instituição adote um padrão para operacionalizar o teto. As instituições financeiras também insistem em mudanças no parcelado sem juros. Segundo interlocutores, elas pedem que o BC "tome para si" a responsabilidade de adotar "medidas prudenciais" para limitar a modalidade, "para fazer com que os juros fiquem onde o risco está”. De acordo com participantes do setor ouvido pelo Valor, o BC avalia que não há tempo hábil para discutir mudanças mais estruturais neste momento. O processo, no entanto, não deve se encerrar neste ano, com o debate se estendendo para 2024. É nesse contexto que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se reunirá amanhã com representantes dos principais emissores de cartão de crédito do país. Participam do encontro Milton Maluhy, do Itaú Unibanco; Mario Leão, do Santander; Marcelo Noronha, do Bradesco; e Cristina Junqueira, do Nubank. Octavio de Lazari Junior, presidente do conselho diretor da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e ex-presidente do Bradesco, também participa. A lei do Desenrola, sancionada no início de outubro, deu 90 dias para que o mercado apresente e o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprove limites para as taxas de juros e encargos financeiros cobrados nos financiamentos (rotativo e parcelado) do cartão de crédito. Caso contrário, as taxas de juros da modalidade serão limitadas ao dobro do valor do principal da dívida no cartão. A expectativa de representantes de diferentes segmentos da cadeia de cartões é a de que o tema seja abordado na próxima reunião do CMN, que inclui a autoridade monetária, o Ministério da Fazenda e o Ministério do Planejamento. O encontro está previsto para 21 de dezembro e é o último do ano. Nada impede, contudo, que o colegiado faça um encontro extraordinário depois dessa data caso haja necessidade. Os bancos estimam que a mudança impacte em no máximo 2 pontos percentuais ao mês os juros do cartão rotativo. Dessa forma, o produto continuaria caro, mas a mudança poderia trazer prejuízos "significativos" às instituições e reduzir a oferta de crédito, segundo fonte que participa das discussões. Cursos Relacionados A avaliação é a de que, mesmo depois que o teto entre m vigor, o assunto deve continuar em pauta porque a nova regra não resolve totalmente o problema. O rotativo do cartão de crédito é a linha mais cara do sistema financeiro. Atualmente, os juros da modalidade estão em 14,94% ao mês ou 431,58% ao ano (embora só possam ser cobrados por um mês), segundo dados de outubro divulgados pelo BC. De acordo com a Febraban, o parcelado sem juros representa 15% do saldo de toda a carteira de crédito das famílias. O grupo de bancos formado por Itaú, Santander, Bradesco e Nubank já mandou ao BC uma proposta de autorregulamentação do teto estabelecido em lei, segundo apurou o Valor. Como o texto do Desenrola é bastante geral, a proposta busca endereçar algumas das dúvidas levantadas pelas instituições financeiras, explicitando, por exemplo, como se dará a operacionalização do teto e sugerindo prazos para implementação. Como o cartão de crédito envolve gastos recorrentes, bancos entendem que o cálculo do valor original da dívida não é estanque. Por exemplo, se no mês 1 o cliente atrasar a fatura e deixar R$ 500 entrarem no rotativo, a cobrança de juros fica limitada a outros R$ 500. Mas, se no mês 2 outros R$ 200 entrarem no rotativo, esse limite não é mais de R$ 500, mas de R$ 700. A ideia é que cada instituição estipule os juros cobrados, limitados ao atingimento do teto legal para a dívida. A operacionalização dessa sistemática, no entanto, não é simples. Por isso as instituições financeiras pedem um prazo para implementação. Como a lei fala em 90 dias, no entanto, não é consensual o entendimento de que a vigência poderá ser postergada. Outro ponto que gerou dúvidas foi se os juros de mora e a multa deveriam ser contabilizados no cálculo do limite e, nesse caso, o entendimento dos bancos é de que não. A presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet), Carol Conway, defende que há espaço para que, juntamente ao detalhamento do teto dos juros, o BC apresente medidas adicionais, que poderiam ter adoção facultativa pelos emissores. Uma delas é a proposta, apresentada pela associação ao setor em reunião realizada em novembro, que prevê a cobrança de juros sobre o consolidado da dívida. A lógica é que, a partir de um certo número de faturas não pagas, o banco possa trazer a dívida a valor presente e passar a cobrar juros também das parcelas vincendas, em uma espécie de vencimento antecipado. Para Conway, a operacionalização da mudança não seria tão complexa e a medida seria capaz de atender a todos os agentes envolvidos na discussão. Limitação no parcelamento sem juros Na discussão do rotativo, a Abranet foi a associação mais vocal na defesa da atual dinâmica do parcelamento sem juros, em contraposição aos grandes bancos. As instituições financeiras têm frisado que não aceitam um acordo que não passe pela limitação da modalidade, o que tem levado à forte reação de credenciadoras independentes e do varejo. Uma fonte a par das discussões frisa ainda que, embora a limitação do parcelado sem juros deva ficar de fora do pacote nesse primeiro momento, o assunto não deve morrer. Parte da diretoria do Banco Central, inclusive, defende que haja mudanças na modalidade e, por isso, o assunto deve continuar em pauta em 2024. "Os estudos que vieram a público não mostram uma relação de causa e efeito da inadimplência com o parcelamento, todas mostraram o contrário. Esse argumento foi derrubado. O Banco Central ficou de fazer estudos e acabou não apresentando, mas na reunião que tivemos no dia 7 [de novembro] o Roberto [Campos Neto] disse que os dados iam na mesma linha de raciocínio, que não há relação de causa e efeito", disse o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci. Para ele, houve uma concessão "descuidada" de cartões de crédito nos últimos anos. Ele ressaltou que aumentou muito a quantidade de pessoas que tem "mais de um plástico". "Foram apresentadas duas propostas, uma dos bancos e outra das maquininhas [no dia 7], mas não vai acontecer nada no dia 21 [CMN] porque não há possibilidade de conciliar. Acho que não vai ter regulamentação e cada banco vai ter um entendimento da lei porque ela não é muito clara, e inclusive não dá poderes ao BC", afirmou. Procurados, BC, Febraban, Itaú, Santander, Bradesco e Nubank não se manifestaram. Initial plugin text Mais Lidas Pagamento usando cartão de crédito Getty Images